GUERRA: O MAIOR DE TODOS OS MALES

Caras e caros amigos, a gente tem idade o suficiente e conhece história o suficiente para saber que estamos lidando com as consequências sempre mais funestas: 

(1) das guerras de 1967 e de 1973, 

(2) das disputas por hegemonia geopolítica no Oriente Médio e 

(3) de um mergulho cada vez mais profundo numa regressão da razão, da diplomacia, da cooperação e da governança global, à medida que as crises socioambientais se aprofundam. 

As guerras da Ucrânia, Síria, Iêmen, Alto Karabakh, Quênia, Líbia, Sahara Ocidental, Burkina Faso etc., etc., (o Geneva Academy monitora atualmente 110 conflitos armados no mundo todo) e agora mais este “eterno retorno” de Israel, mostram, mais uma vez, que nenhuma guerra resolve nada. Admito que obviamente a Segunda Guerra Mundial e as guerras de libertação nacional dos anos 1940-1960 na África e na Ásia  foram necessárias e, de algum modo, resolveram positivamente os conflitos. Mas as guerras atuais não resolvem mais nada. Só pioram as coisas. Como bem afirma Chris Hedges, um grande jornalista que cobriu inúmeras guerras, a guerra é o maior de todos os males – “The Greatest  Evil is War” (2022).

Essas guerras todas de nossos dias são apenas geradoras de outras guerras. Elas fornecem “justificativas” e motivos de vingança para as próximas guerras, até, talvez, “a última”, aquela da qual o Doomsday Clock (o relógio do apocalipse) nos diz que estamos agora a 100 segundos. E, de fato, a Rússia acaba de anunciar sua revisão dos Acordos nucleares (ou do que resta deles) e um novo teste nuclear. De seu lado, Jean-Yves Le Drian, Ministro das Relações Exteriores da França, só joga mais lenha e estupidez na fogueira ao afirmar: “Penso que Vladimir Putin deve também compreender que a OTAN é uma aliança nuclear. Não direi mais nada…”.  Com toda razão, António Guterres declarava já em março de 2022: “A perspectiva de um conflito nuclear, antes impensável, está agora de volta ao reino da possibilidade”. Hoje, falar em “reino da possibilidade” parece um eufemismo. 

Enquanto isso, a comunidade científica em peso grita pelos telhados que já estamos condenados a 2 graus de aquecimento médio global acima do período pré-industrial. Um aquecimento que será atingido no segundo quarto deste século, e que jamais foi experimentado no planeta durante todo o Quaternário, quando nossa espécie nem pensava em existir. Já superamos 1,5C nada menos que 12 ou 13  vezes nas médias mensais e há a virtual certeza de que esse patamar será excedido nas médias anuais na segunda metade deste decênio, senão já em 2024. Aquecemos à taxa média de 0,24C por década entre 1998 e 2016 (entre os dois últimos El Niños) e entre 2010 e 2050 essa taxa de aquecimento está sendo e será de 0,27C a 0,36C por década. Isso significa que, mantida essa trajetória, a temperatura média do planeta aumentará 1 grau C a cada 3 e 4 décadas !!! (o planeta levou quase 1 século – de 1920 a 2015 – para aquecer 1 grau C em relação ao período 1880 -1920…). Todos estamos vendo as secas, incêndios e inundações que estão acontecendo na Amazônia, no sul do país, nos EUA, na Europa, na China, no mundo todo, com um aquecimento de “apenas” 1,1 a 1,3 C desde 2016.

O caos planetário nas próximas duas décadas é inimaginável, isso, claro, se os warlords e os warmongers nos permitirem, a nós, sociedades, sobreviver até lá.  A gente tem que assumir coletivamente a responsabilidade de evitar um aquecimento (muito) acima de 2 graus Celsius. Ainda depende da gente. É nossa responsabilidade tentar diminuir, enquanto ainda possível, a velocidade e a intensidade dos impactos. Não é possível continuar aceitando como inevitável aquela frase célebre do David Suzuki:  “Estamos num carro gigantesco em vias de se chocar contra um muro, e todo o mundo continua discutindo sobre onde cada um vai se sentar”. A gente tem que mudar isso, tem que fortalecer e apostar todas as fichas naquela velha convicção, um tanto démodé, de que há um futuro possível e que não estamos condenados a nos suicidar. 

Luiz Marques –  9/10/2023  (Luiz Marques é autor de Capitalismo e Colapso Ambiental (2014) e de O Decênio Decisivo (2023).

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