ecovirada

EcoVirada repercute o brilhante artigo de Carlos Bocuhy, presidente do PROAM (Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental), publicado no site (o)eco, sobre o afundamento pela Marinha do porta-aviões São Paulo, a 350 km de Recife, no último dia 3 de Fevereiro. Além desse “tóxico naufrágio global”, Bocuhy discorre sobre a incapacidade da Marinha em encontrar uma solução adequada, e sobre o problema mais geral do acúmulo de rejeitos de materiais bélicos, em todo o mundo, desde grandes veículos a armas químicas.

O porta-aviões francês Foch foi construído nos primeiros anos 50. E tem, portanto, uma longa história, como nos conta o G1. Na sua construção foram usadas 9,6 toneladas de amianto como isolamento térmico, material altamente tóxico, e 644 toneladas de tintas contendo micro-plásticos, como revestimento.  Veja aqui os efeitos da contaminação por amianto.

COMPRA DISCUTÍVEL

Já em 2000, durante o governo Fernando Henrique, a sua compra parecia absurda. Por que adquirir uma embarcação construída em 1950, prestes a ser desativada pela França, para substituir outra, o Minas Gerais, construída em 1945? 

Além de maior custo de combustível e da numerosa tripulação necessária para a sua operação, o Foch havia participado de vários testes nucleares na Polinésia Francesa e se suspeitava da sua contaminação nuclear. O site Diário do Centro do Mundo pergunta: 

“O afundamento repentino do São Paulo, mesmo havendo ofertas milionárias pelo casco, traz uma desconfiança. Será que a Marinha não queria se livrar de polêmicas e problemas futuros, que poderiam surgir caso no desmonte se descobrisse que havia ainda vestígios de radiação no casco em porões ou em tubulações antigas?”.

A estreia do Foch  (renomeado São Paulo) na Marinha Brasileira foi desastrosa. Além dos necessários reparos e do longo treinamento da tripulação, em 2005, o rompimento de uma tubulação de vapor de altíssima temperatura deixou muitos feridos e 3 mortos. Outros acidentes se seguiram.

AFUNDAMENTO TÓXICO

foto: meioambiente.culturamix.com – fundo do mar

CONSEQUÊNCIAS AMBIENTAIS DO AFUNDAMENTO 

Segundo o Ibama, as consequências desse naufrágio provocado podem impactar desde seres vivos a inteiros ecossistemas, perturbando gravemente a cadeia alimentar, e contribuindo para o aquecimento global. Os materiais poluentes dessa grande estrutura de 266m de comprimento vão ser liberados no oceano, comprometendo seriamente a biodiversidade tão fundamental para a vida marinha, e podem ser tornar “protagonistas de uma bioacumulação indesejável em organismos aquáticos”. Veja aqui a matéria da Folha de São Paulo sobre os danos ao meio ambiente.

CONSEQUÊNCIAS POLÍTICAS E DE CREDIBILIDADE

A imprensa internacional deu ampla cobertura ao afundamento do porta-aviões pela Marinha do Brasil e às consequências para o meio ambiente. O New York Times observou que o único fim aceitável para o porta-aviões seria a reciclagem, como inicialmente acordado com a Turquia, ou como propunha a Arabia Saudita. The Guardian informa sobre as organizações que acusam o Brasil de violar 3 tratados internacionais com o afundamento do São Paulo (as convenções de Basileia, Estocolmo e Londres). O jornal francês Le Monde, além da denúncia do desastre ambiental, menciona o esforço feito pelo Ibama e pelo MPF do Brasil (Ministério Público Federal) para evitar o afundamento.

Naturalmente, a imagem do Brasil, com a decisão do afundamento pela Marinha e o consentimento do presidente Lula, sai prejudicada pela segunda vez, neste primeiro mês do novo governo. Em recente visita à Argentina, o presidente prometeu ao seu colega argentino o financiamento de um gasoduto para trazer ao Brasil o gás de xisto, projeto envolvido por graves problemas ambientais e sociais (veja:  Por que não queremos o gasoduto da Patagônia).

A instalação do novo governo trouxe aos brasileiros e à comunidade internacional, preocupada com as mudanças climáticas, com o desmatamento dos biomas brasileiros e com o genocídio dos povos indígenas, uma lufada de esperança. A nomeação de Marina Silva para o Ministério do Meio Ambiente, a criação do Ministério dos Povos Originários  com uma indígena como ministra e a reestruturação de organizações aparelhadas pelo governo anterior, como Ibama, Funai, ICMBio, etc, pareciam indicar uma total inversão de rota. Vamos esperar que esses dois episódios, apesar da sua gravidade, sejam incidentes de percurso.

Maristela Jardim Gaudio

Crédito da foto da capa: Marinha Brasileira

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