O Mundo dá mais um passo rumo ao Apocalipse

O traço definidor de nossos dias é a corrida contra o relógio, uma corrida que, indubitavelmente, estamos perdendo.

Já em 2006, Sir Nicholas Stern advertia: “A evidência da seriedade dos riscos da inação ou dilação é agora abundante. Corremos risco de destruições numa escala maior que as provocadas pelas duas guerras do século passado. O problema é global e a resposta deve ser uma colaboração em escala global”. Em 2009, a Agência Internacional de Energia voltava a advertir:

“Salvar o planeta não pode esperar. Cada ano que passa devém mais estreita a janela de oportunidade de ação em relação às emissões em dado período – e os custos de transformação do setor de energia aumentam. (…) É chegado o tempo de fazer as escolhas duras necessárias para transformar as promessas em ação” (veja AIE, World Energy Outlook 2009, em rede).

O quinto relatório do IPCC (2013) sublinha: “os riscos que estamos correndo aumentarão a cada ano” (veja: IPCC, Climate Change 2013. The Physical Science Basis, p. v, em rede).

Em 2012, o Low Carbon Economy Index (LCEI) advertia que “ultrapassamos um limiar crítico” e apontava a necessidade de descarbonizar a economia global a uma taxa de 5,1% ao ano até 2050, para termos uma chance razoável de manter o planeta abaixo do limiar de aquecimento médio global de 2 graus C. Para a edição de 2014 do LCEI, a tarefa passou a ser descarbonizar a economia a uma taxa de 6,2% ao ano, todos os anos até 2100, sendo que a taxa média de descarbonização desde 2000 foi de 0,9%… . Em sua edição de 2016, o LCEI aumentou essa taxa para 6,5% ao ano. À medida que o tempo passa, ficamos mais distantes de nossa meta e, portanto, mais próximos do desastre.

Para retornar à metáfora do relógio, em 2015 o Bulletin of the Atomic Scientists adiantou em dois minutos os ponteiros de seu relógio – o Doomsday Clock –, colocando-nos a três minutos da meia-noite, agora também, e pela primeira vez, por causa da ameaça ambiental:

“Hoje, as mudanças climáticas descontroladas e a corrida armamentista nuclear resultante da modernização de imensos arsenais colocam ameaças extraordinárias e inegáveis à continuação da existência da humanidade” (veja “It’s now three minutes to midnight”. Bulletin of the Atomic Scientists, 22/I/2015, em rede).

Neste início de 2017, o Bulletin of the Atomic Scientists adiantou em mais trinta segundos os ponteiros de seu relógio apocalíptico – o Doomsday Clock. Estamos agora a apenas 2 minutos e meio da destruição global, graças, entre outras ameaças, à retórica belicista e negacionista de Donald Trump e ao contínuo agravamento dos desequilíbrios ambientais, notadamente, das mudanças climáticas e das extinções em massa de espécies animais e vegetais.

Em 1953, quando os EUA e a URSS testaram suas armas termonucleares, mais conhecidas como bombas de hidrogênio ou H-bombs, o doomsday clock marcou 2 minutos para a meia-noite. Se excetuarmos esse ano, jamais estivemos mais próximos do naufrágio, talvez da aniquilação, das sociedades contemporâneas, como mostra o gráfico abaixo. 

doomsday clock1

Os perigos que nos ameaçam hoje são decerto mais difíceis de combater que os de 1953. Porque até hoje foi possível evitar, por vezes, é verdade, in extremis, uma guerra nuclear entre os EUA e outras potências nucleares. Mas não se está conseguindo evitar a corrosão acelerada das coordenadas ambientais que permitiram o florescimento de toda a civilização ao longo do Holoceno. 

Esses desequilíbrios, embora ainda relativamente difusos, começam no século XXI a se precisar.  Ao reimpulsionar o uso de combustíveis fósseis, a administração Donald Trump deve acelerar ainda mais esse processo. Quando os efeitos desses desequilíbrios finalmente se precisarem de modo absolutamente inequívoco, teremos com toda a probabilidade ultrapassado todos os pontos de não retorno. 

Como bem adverte James Hansen, “se esperarmos que o mundo natural se revele claramente, pode ser tarde demais” (If we wait for the natural world to reveal itself clearly, it may be too late.  Veja: James Hansen, “Ice Melt, Sea Level Rise and Superstorms: The Threat of Irreparable Harm” 22/III/201). 

Luiz Marques

Todos os anos, um painel de cientistas e especialistas nos diz quanto resta para o fim do mundo. Fazem isso de um jeito simbólico, com um relógio prestes a chegar ao abismo, à meia-noite: o indicador são os minutos que faltam para esse momento. E hoje estamos muito perto, tão somente dois minutos e meio para o apocalipse, segundo esse grupo que inclui 15 prêmios Nobel. Os responsáveis pelo grupo o adiantaram 30 segundos na direção da zero hora. Nunca tínhamos estado tão perto da destruição da humanidade desde 1953, quando os EUA e a URSS puseram sobre a Terra suas primeiras bombas termonucleares, com uma capacidade de destruição desconhecida até então.

Naquele momento, a humanidade esteve a dois minutos de seu fim. A bomba termonuclear de nossa época não é produto da Guerra Fria, mas de um fenômeno muito mais quente: a verborragia de Donald Trump e o aquecimento global. “As palavras importam. Não tanto como os fatos, mas importam muito”, afirmou uma porta-voz do painel antes de anunciar a nova situação. As palavras que preocupam se referem às sugestões de Trump de que o Japão deveria ter armamento atômico para enfrentar a ameaça da Coreia do Norte (você pode consultar o texto do painel em inglês neste PDF).

O mundo estava fazia dois anos parado a três minutos da hora fatídica, a mesma hora que em 1984 — a segunda pior crise da história deste relógio —, quando as duas superpotências rompiam relações e se alcançava um novo pico no arsenal atômico enquanto se avizinhava outra escalada rearmamentista. Curiosamente, em 1987 era Donald Trump que promovia o desarmamento dos EUA e da URSS. Hoje, ele é o problema que o planeta enfrenta. Em dezembro, como presidente eleito, Trump dizia que seu país deveria fortalecer sua capacidade nuclear até que o mundo recuperasse a razão em relação a essas armas.

“Putin e Trump podem optar por se comportarem como homens de Estado ou como meninos petulantes”, disse o painel ao mencionar os problemas que ressurgiram entre as duas grandes potências nucleares, com uma escalada dialética e em lugares como a Ucrânia e a Síria. “Esta situação mundial já ameaçadora foi palco do aumento de um nacionalismo estridente em todo o mundo em 2016, até mesmo em uma campanha presidencial dos Estados Unidos, durante a qual o vencedor, Donald Trump, fez comentários inquietantes sobre o uso e a proliferação de armas nucleares, e expressou sua incredulidade quanto ao consenso científico sobre as mudanças climáticas.”

O Relógio do Fim do Mundo (Doomsday Clock, como é denominado em inglês) foi criado em 1947 pelo conselho do Boletim de Cientistas Atômicos, um grupo de especialistas que pretendia conscientizar sobre o risco do armamento nuclear. Em sua primeira edição foi posicionado a 7 minutos da meia-noite. Em 1995, estávamos a 14 minutos. Em 2007 as mudanças climáticas entraram pela primeira vez entre suas preocupações para o futuro da humanidade. Neste caso, o aquecimento foi outro fator decisivo para o painel: o ano passado foi o mais quente dos registros históricos, e foi o terceiro ano consecutivo em que isso aconteceu. O grupo de cientistas reconhece o peso da situação política nos EUA e das pessoas que estarão no comando do Governo e, neste campo, o fato de a nova Administração dos EUA ser “abertamente hostil” a tomar medidas contra as mudanças climáticas.

Além disso, outra das preocupações expressadas no Boletim foi a das ameaças tecnológicas emergentes, em relação com os ciberataques, mas também com todos os problemas que a inteligência dos EUA reconheceu que surgiram durante a campanha eleitoral, com a ação de hackers e desinformação. E ressaltam especialmente a falta de respeito dos líderes mundiais pelos fatos, os dados e o conhecimento científico.

Convém lembrar que há 70 anos esse relógio nem sequer existia. A humanidade não havia dado motivos a si mesma para prever sua autodestruição.

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