Alarme na Bacia do Tapajós

São muitos os problemas que afligem e ameaçam a bacia do rio Tapajós, uma das maiores bacias hidrográficas do país, com mais de 490 mil km2, e que ocupa 6% do território do Brasil:

– O garimpo ilegal que envenena indígenas, rios e animais, além de devastar o terreno e destruir sitios arqueológicos. 

– A agressão aos indígenas por garimpeiros armados. 

– O desmatamento e a apropriação ilegal de território indígena e de áreas protegidas. 

– A expansão do agronegócio e da estrutura para apoiá-lo.

– A construção de infraestrutura, como hidrelétricas, rodovias, ferrovias, hidrovias, barragens e portos, sem planejamento cuidadoso, sem consulta às comunidades indígenas e ribeirinhas, mas que tem grande impacto sobre o modo de vida dessas populações.

O rio Tapajós é formado pela confluência do rio Teles Pires com o rio Juruena, em Barra de São Manuel, na fronteira entre Pará e Mato Grosso, e percorre uma extensão de aproximadamente 800 km até desaguar no Amazonas, a cerca de 695 km de Belém. A sua bacia está distribuída pelos estados do Mato Grosso, Pará, Rondônia e Amazonas.

O nome Tapajós é originário de um grupo indígena que vivia à beira do rio, cujos remanescentes se encontram atualmente na área urbana de Santarém e na vila de Alter-do-Chão.  No século XVII, os Tapajós, de língua do tronco Tupi, controlavam uma extensa área no estado do Pará.

Estudiosos de muitas áreas e diversas organizações têm se ocupado recentemente da bacia do Tapajós:

. Bruna Cigaran da Rocha e Vincenzo Honorato de Oliveira, em Floresta Virgem? O longo passado humano da Bacia do Tapajós, afirmam que a floresta Amazônica não é absolutamente virgem e intocada, mas que vem sendo modificada há milênios pela ação do homem. 

Objetos como pontas de projéteis feitos de pedra lascada — encontrados em diferentes pontos do Tapajós — sugerem que os primeiros humanos percorreram a região há milênios, possivelmente ainda na transição entre o Pleistoceno e o Holoceno, ou seja, há cerca de 10 mil anos. Uma compilação feita em 2013 mostra a existência de mais de 400 sítios arqueológicos na bacia do Tapajós.

“O garimpo tem destruído incontáveis sítios arqueológicos, numa degradação irreversível da paisagem. Todas as camadas de solo que são camadas culturais, que têm um pacote arqueológico, são destroçadas. É um processo muito, muito violento”, diz Rocha. “Com um processo tão acelerado e sem recursos para a pesquisa, cria-se a situação inusitada de que muitas vezes os garimpeiros são os primeiros a encontrarem vestígios arqueológicos. Mas tudo se perde.”

. Maurício Angelo, jornalista criador do Observatório da Mineração, lança um grito de alarme, e conta como, devastados pelo avanço do que é vendido como desenvolvimento, inúmeros sítios arqueológicos jamais serão sequer conhecidos.

A partir de aproximadamente 4.500 anos atrás, há indícios importantes que indicam práticas de policultura florestal, como o cultivo de milho, batata doce, cereais e tubérculos. A arqueologia tem um papel central em revelar a riqueza histórica, cultural e socioeconômica dessa ocupação.

. A situação é muito grave: entre os lugares a serem preservados encontra-se Monte Alegre, cujas  pinturas rupestres já descritas por Alfred Russel Wallace, na metade do século XIX, em seu livro Viagens pelos Rios Amazonas e Negro, foram finalmente datadas, no fim do século XX. Essa primeira datação, homologada por radiocarbono, surpreendeu a comunidade científica: as pinturas de Monte Alegre e da caverna Pedra Pintada foram feitas desde 11.200 anos atrás, colocando ambos os sítios no mapa das ocupações humanas mais antigas das Américas. Foi descoberta uma longa sequência de ocupação quase contínua desde os primeiros assentamentos até cerca de 500 anos atrás, período em que ocorreram as primeiras entradas de europeus na Amazônia.

Vale a pena ler no National Geographic a história dessas descobertas e da interessante correlação estabelecida entre as pinturas e as cerâmicas, o que acabou por revelar os elos da área de Monte Alegre com Santarém e com outros povoados distantes, localizados muito mais a norte. Perto de Santarém, há um sambaqui, o Taperinha, que contém as cerâmicas mais antigas do continente.

. Extraordinária a iniciativa da organização International Rivers, que lançou em 14 de Fevereiro de 2022, a publicação Tapajós sob o Sol Mergulho nas características ecológicas, socioculturais e econômicas da bacia hidrográfica.   Com prefácio de Ailton Krenak e escrito por um conjunto de pesquisadores que se debruçaram sobre os aspectos socioambientais deste que é um dos maiores ecossistemas de água doce do Brasil, o livro online é gratuito e traz estudos aprofundados sobre arqueologia, biologia e economia sustentável. 

. Estão previstas inúmeras novas hidrelétricas na região, sendo três no rio Tapajós, quatro no rio Jamanxim e cinco no rio Teles Pires. Já na bacia do rio Juruena, afluente do Tapajós, estão ainda previstas 138 hidrelétricas, entre usinas de grande, médio e pequeno porte. Atualmente, a região comporta 32 usinas de pequeno e médio porte em operação, 96 empreendimentos em planejamento e outras 10 em construção.

. Nove por cento da soja mundial é produzida na bacia do Tapajós (Aprosoja Mato Grosso), com uma expansão contínua de terras para agricultura e o desenvolvimento de infraestrutura para apoiá-la.

“A gestão do rio e de sua bacia hidrográfica para a sustentabilidade ambiental é fundamental para manter a biodiversidade e garantir que os serviços ecossistêmicos fornecidos aos povos da bacia – que dependem desses serviços – permaneçam abundantes, ao mesmo tempo em que orientam o desenvolvimento de uma forma que seja benéfica para todos”. Veja o texto completo – Conservação da Bacia do Tapajós: Uma Visão de Sustentabilidade – no The Nature Conservancy – Brasil.

. Todos os grandes projetos de infraestrutura tinham sido suspensos em 2016, mas, depois de quase dez anos sem licitar novos projetos hidrelétricos de médio ou grande porte no Brasil, em janeiro de 2022, ano eleitoral, o governo federal revelou que voltou a estudar a construção de três grandes usinas na bacia do rio Tapajós, no noroeste do Pará, em um dos locais mais preservados da Amazônia.

. Difícil dizer qual o problema mais grave da bacia do Tapajós. Pode-se afirmar que 600 km de rios e 100% da população indígena Munduruku está contaminada pelo mercúrio. A devastação do ambiente é avassaladora. No sudoeste do Pará e no Médio Tapajós, foram devastados 632 km de rios desde 2016. Um aumento de 2.000% em 5 anos, como bem revela o Observatório da Mineração.

. Entre os vários estudos e análises que propõem soluções de desenvolvimento sustentável, citados acima, acrescentamos o importante estudo do WWF BRASIL, de 2016.

Os problemas do Amazonas, do Pantanal, ou do Ártico e da África podem parecer irrelevantes para as nossas vidas nas grandes cidades do sudeste do Brasil. Podem parecer, mas não são. As mudanças climáticas estão aí para nos lembrar que a ação do homem sobre o meio ambiente tem consequências que afetam todo o planeta e todas as formas de vida do planeta.

Foto: Vaso de cerâmica antropomórfico encontrado na região do Rio Tapajós, datado do primeiro milênio d.C.. Foto: Museu Nacional, CC BY-SA 4.0.

Categorias: